Bolsonaro volta a planejar pronunciamento para rebater críticas sobre a pandemia
Com a escalada da pandemia do coronavírus, que atingiu nesta semana recorde de mortes, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) voltou a planejar a gravação de um pronunciamento em cadeia nacional de rádio e televisão.
Na manhã desta sexta-feira (5), dia seguinte ao ter afirmado que não é hora mais para frescura, o presidente convocou integrantes da equipe ministerial para uma reunião no Palácio do Planalto.
O ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, que cumpre agenda de viagem, não participou do encontro. E o vice-presidente Hamilton Mourão, mais uma vez, não foi chamado.
O objetivo da reunião, segundo assessores presidenciais, foi avaliar estratégias de reação à piora da pandemia. O receio de integrantes do governo é o de que a média diária de mortes aumente nas próximas semanas.
O encontro desta sexta-feira também serviu para discutir dados e números que possam ser utilizados pelo presidente em um discurso em rede nacional, que ele avalia gravar no final de semana. Nesta semana, Bolsonaro já cogitou duas vezes gravar discursos à nação, mas desistiu em ambas.
Nos dois episódios, o presidente foi convencido de que não era hora de fazer um embate com prefeitos e governadores, que adotaram medidas de restrição para tentar diminuir o número de internações pela doença.
O aumento das críticas em relação à postura do presidente, no entanto, pressionou o Palácio do Planalto a reagir com um discurso público.
Segundo assessores presidenciais, uma estrutura de gravação foi montada durante a manhã no Palácio da Alvorada. A ideia inicial era a de que ele gravasse nesta sexta, quando seria exibido à noite em cadeia nacional.
Após a reunião, no entanto, Bolsonaro foi convencido a deixar a gravação para o final de semana. Para evitar panelaços e buzinaços, assessores palacianos têm defendido que o discurso seja exibido apenas no final de semana e nas redes sociais, evitando televisão e rádio.
A linha defendida no Planalto é que o presidente destaque na gravação a decisão de comprar doses das vacinas da Pfizer e da Janssen e a aprovação de medida provisória que facilita a compra de imunizantes contra o coronavírus.
Bolsonaro foi orientado por ministro palacianos a moderar o discurso contra as gestões municipais e estaduais, mas o presidente já sinalizou, segundo assessores do governo, que reforçará posição contrária a lockdowns.
Nos últimos dias, o presidente se equilibrou entre dar o aval para a compra de um um novo lote de imunizantes e fazer discursos contra o isolamento social.
Ao mesmo tempo que liberou o Ministério da Saúde para sinalizar a compra das vacinas da Pfizer e da Janssen, Bolsonaro potencializou sua retórica radical como aceno à base ideológica.
No entanto integrantes do bunker digital do Palácio do Planalto identificaram que diminuiu nas redes sociais a defesa à postura do presidente contrária a medidas de restrição.
A reação nas redes sociais alarmou a equipe de Bolsonaro, que considerou indispensável apresentar à sociedade uma espécie de prestação de contas sobre o que o governo federal tem feito para reagir às críticas ao presidente.
Como mostrou o jornal Folha de S.Paulo nesta quinta-feira, Bolsonaro perdeu desde o início deste ano parte de sua base de apoio digital, diante do agravamento da crise da pandemia do coronavírus, e ainda viu a aproximação do ex-presidente Lula (PT) no ranking de popularidade digital.
A popularidade nas redes sociais é o principal trunfo de Bolsonaro em busca de sua reeleição no ano que vem, assim como foi em 2018 para a sua eleição ao Palácio do Planalto, quase sem tempo de TV na propaganda eleitoral, e tem sido no dia a dia de seu governo.
A queda de patamar de Bolsonaro aparece em atualização nesta semana do ranking do Índice de Popularidade Digital (IPD), elaborado pela consultoria Quaest. A métrica avalia o desempenho de personalidades da política nacional nas plataformas Facebook, Instagram, Twitter, YouTube, Wikipedia e Google.
Bolsonaro segue na primeira colocação do ranking, dentre uma lista de 13 nomes que devem influenciar as eleições presidenciais de 2022. O presidente, porém, está em um patamar 20 pontos abaixo em relação ao que acumulava em 2020.
O IPD é medido em uma escala de 0 a 100, em que o maior valor representa o máximo de popularidade. Bolsonaro saiu da casa dos 80 pontos no ano passado e agora se fixou no patamar de 60.
São monitoradas seis dimensões nas redes: fama (número de seguidores), engajamento (comentários e curtidas por postagem), mobilização (compartilhamento das postagens), valência (reações positivas e negativas às postagens), presença (número de redes sociais em que a pessoa está ativa) e interesse (volume de buscas no Google, Youtube e Wikipedia). A métrica é relacional, ou seja, varia a depender das personalidades que estejam sendo comparadas.
Desde o início da disseminação do novo coronavírus, Bolsonaro tem falado e agido em confronto com as medidas de proteção, em especial a política de isolamento da população.
Ele já tinha usado as palavras histeria e fantasia para classificar a reação da população e da imprensa à pandemia. Na quinta (4), afirmou: “Nós temos que enfrentar os nossos problemas, chega de frescura e de mimimi. Vão ficar chorando até quando? Temos de enfrentar os problemas. Respeitar, obviamente, os mais idosos, aqueles que têm doenças, comorbidades, mas onde vai parar o Brasil se nós pararmos?”.
Bolsonaro também distribuiu remédios ineficazes contra a doença, incentivou aglomerações, atuou contra a compra de vacinas, espalhou informações falsas sobre a Covid-19 e fez campanhas de desobediência a medidas de proteção, como o uso de máscaras.
Neste ano, porém, uma sequência de acontecimentos ligados à pandemia podem ter contribuído para esse avanço do desgaste digital do presidente.
Desde o início do ano, após o fim do pagamento das parcelas do auxílio emergencial, o país conviveu com a crise da falta de oxigênio no Amazonas, o atraso no processo de vacinação e novos recordes de mortos e contaminados pela Covid-19.
Na quarta-feira (3), o país bateu novo recorde de mortes, 1.840. O total de óbitos chegou a 259.402 e o de casos, a 10.722.221, desde o início da pandemia. O Brasil enfrenta o pior momento da pandemia, com situações críticas em todas as regiões do país.
FOLHAPRESS