Projeto “60+” usa abraços e atividades para combater depressão

Projeto “60+” usa abraços e atividades para combater depressão

Um lugar onde a palavra “acolhimento” ganha ainda mais força. São tantas histórias de vida reunidas, experiências compartilhadas e acima de tudo, um momento de diversão. Quem tem 60 anos ou mais encontra no projeto social “Estrela Branca” voluntários que ouvem, amparam e ensinam.

Criada 9 anos atrás e apoiada pelo Governo de Mato Grosso do Sul, a iniciativa surgiu da parceria entre dois amigos no Bairro Moreninha, região Sul de Campo Grande. Nossa equipe de reportagem acompanhou uma manhã de atendimentos com oferta de lanche, orientações sobre como evitar violência contra idosos, aulas de artesanato e de educação física.

Durante os exercícios, na primeira fila da turma, dona Lúcia Maria Nunes de Lima, chama atenção pelo sorriso no rosto. Aos 73 anos, a vendedora aposentada não troca as idas ao projeto por nada. Com doenças na família como esquizofrenia, dependência química e a perda recente de um neto, os momentos vividos no projeto representam distração.

“Eu passo minhas dificuldades, mas eu sou uma pessoa muito expansiva. Eu gosto de demonstrar, não gosto de guardar nada para dentro. Aqui eu fico uma pessoa bem solta, bem leve, tenho muitas amizades, a turma é muito boa”, diz.

O atendimento vai além do lanche e das aulas. Uma simples troca de carinho pode ser o que se espera. Em muitos dos idosos, os voluntários percebem sentimentos de abandono, rejeição, isolamento. O grupo estabelece um vínculo, por isso a definição do lugar como “segunda família”. A troca de emoções leva ao apoio emocional. O cuidado com a saúde mental também é prioridade.

“Eles trazem para dentro do grupo perda de filhos, de marido e a gente tenta trabalhar isso com acolhimento, um abraço que seja. Tudo isso acaba sendo um suporte muito necessário. Teve uma idosa que perdeu a filha e veio aqui para associação, quis dar um abraço em todos nós. Falou que agora não tem a filha, mas ainda tem a gente para dar apoio, um suporte, uma segurança. Naquele dia nosso coraçãozinho ficou quentinho. Foi muito bom pra ela porque foi abraçada, sentiu-se muito bem acolhida e pra gente também ao vermos o quanto é importante nosso trabalho na vida deles”, conta Rafaela de Oliveira da Silva, psicóloga.

Dona Nilda Souza Silva, conhecida como Baiana, adora pintar, dançar e fazer amizades. Além do “Estrela Branca”, a aposentada de 77 anos, participa de outros projetos sociais voltados às pessoas da terceira idade. “Eu não fico doente porque não dá tempo. É difícil eu ficar em casa. Bato perna o dia inteiro. Onde tem atividade eu tô indo”, conta aos risos.

Aos 79 anos, o vigilante aposentado Francisco de Andrade também participa de outros projetos onde joga vôlei e bocha. No “Estrela Branca” gosta de passar o tempo preenchendo palavras cruzadas porque “mexem com a memória”. Foi conhecer o projeto a convite de uma amiga e percebeu o quanto uma simples atividade em grupo pode afastar a tristeza. “Eu era muito depressivo, acabou tudo. Hoje estou bem, não falto nenhum dia aqui. Eles ajudam a gente bastante”, relata.

Aurea Maria Nunes de Oliveira trabalhou em um hotel durante duas décadas e aos 63 anos está descobrindo uma nova profissão. Adora fazer curso de pintura e costura. “Já conserto, já arrumo, faço bolsa. Já fiz calcinha, roupa para mim também, camiseta para meu netinho, shortinho para ele”. E complementa: “Estou amando isso aqui”. 

Além da sede na Moreninha I, o projeto que está mudando a vida da dona Aurea e outros 69 idosos, faz atendimentos nos bairros Paulo Coelho Machado, Jardim Los Angeles, Aero Rancho e Homex. As atividades vão desde distribuição de alimentos até aulas de futebol para crianças. Ao todo são em torno de 6 mil pessoas beneficiadas por ano.

Tudo começou com a parceria entre dois amigos. O atual coordenador Gilson Natis é um deles. Trabalhava com um grupo de jovens de famílias de baixa renda e o amigo dele, dono de um mercado chamado Estrela, fazia doações de alimentos para ajudar a comunidade. Daí surgiu a ideia de criar uma Organização da Sociedade Civil. E a palavra “branca” no nome vem de algo que não tem envolvimento com questões políticas.

“Todo ser humano, independente de religião, tem que ser útil para alguma coisa. Tem que ter um propósito na vida e nós começamos pequenininhos. Nosso objetivo aqui era doar um sacolão por semana, pegar uma cadeira de rodas de alguém e emprestar para outro. Hoje nós somos um complexo. Isso deixa a gente muito feliz”, ressalta.

O acolhimento feito pelos voluntários garante mais qualidade de vida e demonstra o quanto é importante seguir com ações assim pelas regiões da cidade. “Quando a gente executa um trabalho como esse diminui lá no posto de saúde. Diminui a depressão, a ansiedade que é a porta para muitas outras doenças. Você fazendo o atendimento psicológico, dando uma motivação aos assistidos pela ONG, eles vão ter menos casos de doença, de depressão. Vão diminuir a fila do remédio”, detalha.

A parceria com iniciativas assim é prioridade para o Governo de Mato Grosso do Sul, através da Sead (Secretaria de Estado de Assistência Social e dos Direitos Humanos) que faz um acompanhamento do trabalho feito pelas organizações da sociedade civil.

“O Governo do Estado vem dando incentivo financeiro e até estrutural para algumas organizações. É um dinheiro bem investido. O chamamento público do ano passado foi de R$ 4,5 milhões para 54 organizações. Temos emendas parlamentares, são cerca de 85 entidades beneficiadas por emendas. Este ano pretendemos estender isso para mais de 70 organizações beneficiadas com recurso público”, diz  José Henrique de Andrea Denis, superintendente do Terceiro Setor na Sead.

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